Juntos, os manifestantes usaram o próprio corpo para formar a frase “Pare Belo Monte” (Foto: Thiago Araújo)
“Pare Belo Monte”. A frase era
formada por cerca de 300 pessoas, que juntas representavam letras. À luz
do nascer do sol, sob as águas calmas do rio Xingu, os manifestantes
lutavam para sangrar uma gigante. A partir de uma iniciativa indígena,
com apoio de movimentos sociais, acadêmicos, estudantes e até da
imprensa estrangeira, manifestantes ocuparam ontem (15), por volta das
5h, uma das áreas conhecidas como “ensecadeiras”, onde está sendo
construída a Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Contrários à política
desenvolvimentista do governo federal, os manifestantes abriram, com
cerca de 50 picaretas, simbolicamente, uma passagem na barragem de terra
que impedia o fluxo do rio, o primeiro passo para construção de um dos
reservatórios que secaria uma grande parte do Xingu e inundaria uma
vasta área habitada no entorno de Altamira.
Numa das ensecadeiras do sítio Belo
Monte, cerca de 500 mudas de açaí foram plantadas, simbolizando a
recuperação, prevista por lei, das áreas desmatadas pelo consórcio Norte
Energia nas margens do rio. Em seguida, 200 cruzes brancas foram
cravadas ao longo da área, representando a morte do rio para
ribeirinhos, pescadores, agricultores e indígenas do Xingu.
XINGU + 23
Todos os protestos aconteceram dentro da
programação Xingu + 23, evento que ocorre paralelamente à Rio + 20 e
busca chamar atenção de autoridades mundiais, para os problemas que a
população nativa vem sofrendo desde o início da construção de Belo
Monte, em meados do ano passado. Até ontem, o ato foi pacífico, sem
nenhum conflito registrado entre manifestantes e a polícia ou a
segurança privada do consórcio.
“Nós não queremos nada demais. Nós
queremos os nossos direitos: uma terra pra gente trabalhar sossegado,
mais nada”, falou Edmilson Tembé, 53 anos, que veio de Santa Maria para
apoiar os indígenas e a população atingida pela usina. Edmilson estava
presente em Altamira, há 23 anos, quando o 1º Encontro dos Povos
Indígenas do Xingu impediu o barramento do rio. “Querem tirar os índios e
colocar num lote de terra pequeno, perto da cidade, onde o índio não se
habitua. Não tem caça, não tem pesca, nem espaço pra plantar, vai viver
do quê?”, indagou.
O movimento contrário a Belo Monte
parece ser consenso entre a população carente de Altamira, que alega que
a cidade está inchando sem planejamento urbano e que os postos de
trabalho estão sendo ocupados por pessoas de fora da região. Ainda
ontem, uma marcha de estudantes foi às ruas da cidade protestar contra
os impactos sociais e ambientais causados pela usina.
De acordo com o governo federal, Belo
Monte é um projeto essencial para suprir futuros déficits de energia e
eventuais apagões. Para Antônia Melo, uma das lideranças da ONG Xingu
Vivo, Belo Monte é um problema nacional e diz respeito a todos. “O
projeto é ditatorial e foi imposto sem nenhuma consulta popular”,
afirma.
Segundo ela, cerca de 40 mil famílias
terão que ser remanejadas para a construção de Belo Monte. Além disso,
segundo os manifestantes, a obra irá beneficiar apenas grandes
mineradoras e empreiteiras.
A vila Santo Antônio, bem em frente ao
canteiro de obras da usina, foi o palco inicial da Xingu + 23. Quem
sabe, a vila tenha celebrado a última festa do Santo que dá nome à
localidade, no último dia 13, antes de ser inundada pelos efeitos da
usina. No cartaz do evento, a salvação das famílias afetadas pela
barragem, talvez, representasse a força da esperança criada pela união
dos manifestantes. “O santo das causas impossíveis contra o fato
consumado”. (Diário do Pará)
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