Advogados e familiares dos detentos dizem que realocação foi motivada pelo fim do pacto de paz das facções criminosas
A Secretaria de Justiça e Cidadania do Ceará (Sejus), em parceria com outras instituições, realizou intensa transferência de detentos entre unidades do sistema penitenciário cearense durante o dia de ontem. De acordo com a assessoria de comunicação da Pasta, as mudanças têm o objetivo de "desarticular lideranças e prevenir conflitos nos estabelecimentos prisionais".
Detalhes como a quantidade de presos realocados e em quais unidades aconteceram a operação não foram divulgados pela Secretaria. Entretanto, o foco principal das transferências foi o Complexo Penitenciário de Itaitinga II, que fica localizado no Km 17 da BR-116, no município que dá nome ao complexo que abrange cinco unidades prisionais, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).
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Por lá, as transferências começaram por volta de 9h e seguiram até a noite. De manhã e no início da tarde, veículos do Batalhão de Polícia de Choque (BpChoque) escoltaram ônibus para entrar e sair do Complexo. Familiares dos detentos se reuniram na frente do portão que dá acesso aos presídios, ainda de manhã, para pedir informação sobre a operação, mas não obtiveram sucesso e deixaram o local no fim da tarde.
A Sejus informou que "ao longo da semana, assistentes sociais e equipe do Núcleo de Atendimento aos Familiares de Internos (Nuasf) estarão prontos a receber os familiares e prestar informações sobre para onde os internos foram transferidos". Ainda de acordo com a nota emitida pela assessoria de comunicação, os agentes penitenciários realizaram a operação com o apoio do Ministério Público do Ceará (MPCE), das polícias Civil, Militar e Rodoviária Federal e do Corpo de Bombeiros.
Confronto entre facções
Apesar da Sejus não confirmar, a reportagem apurou com advogados e familiares dos presos que a realocação foi motivada pelo fim do pacto de paz entre duas organizações criminosas que têm atuação em todo o Brasil, inclusive no Ceará: o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV).
Segundo um advogado que preferiu não se identificar e que tem 11 clientes que são membros do PCC e estão detidos no Complexo Penitenciário de Itaitinga II, presos pertencentes a outras facções exigiram aos diretores penitenciários que os integrantes do PCC fossem separados. Parentes que mantém contato diário com os presos afirmaram que o prazo dado pelas organizações criminosas para a divisão era até 0h de hoje. O advogado revelou ainda que os clientes contaram que existiam ameaças de que a Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor Clodoaldo Pinto (CPPL II) e a Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor Jucá Neto (CPPL III), duas das unidades do Complexo, 'iam quebrar' (ou seja, ter rebeliões e possíveis conflitos).
"As outras facções se juntaram contra o PCC, mas o PCC é maioria no Ceará", afirmou o advogado. A guerra que poderia chegar aos presídios cearenses deixou vítimas em outro estado. Entre o último domingo (1º) e segunda-feira (2), 60 presos que seriam do PCC foram mortos em presídios do Amazonas, e os crimes foram atribuídos à organização criminosa Família do Norte (FDN), que teria agido com o conluio de outras facções. Entretanto, a Sejus nega que a transferência de presos no Ceará tenha relação com a rebelião e a chacina ocorridas em Manaus.
O advogado entrevistado acredita que a separação de presos a partir das facções criminosas, criando unidades específicas para cada organização, seria perigoso, caso se confirme. "A massa carcerária que é réu primária vai ser obrigada a entrar em uma facção", apontou.
Familiares dos detentos do Complexo Penitenciário II dividiram opiniões sobre a possível divisão por organizações. A esposa de um preso que não é afiliado a nenhuma facção disse que estava aflita porque o marido já estava acostumado à cela que se encontrava locado e não sabia como seria agora. Já a esposa de outro detento, membro do CV, comemorou a separação e disse que era um desejo antigo do marido e dos seus amigos.
Negativa
O Ministério Público do Ceará (MPCE), através da promotora Joseana França, designada para acompanhar as transferências, afirmou que os presos não foram divididos por facções, e sim realocados para ocupar parte da Casa de Privação Provisória de Liberdade Agente Elias Alves da Silva (CPPL IV) que estava sendo reformada. "É uma acomodação que a Sejus fez, que já era prevista pela direção dos presídios. Coincidiu de acontecer logo após esse fato de Manaus".
Segundo a promotora, não existiu imposição das facções criminosas sobre o Estado para acontecerem as transferências. "A gente tem a preocupação de combater esses grupos, mas de outra forma. Nós fazemos o acompanhamento, junto com as direções das unidades, um trabalho coeso, que não se submete às facções", explicou.( Diário do Nordeste )
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