quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Presos são transferidos para 'prevenir conflitos' no Ceará


 

Advogados e familiares dos detentos dizem que realocação foi motivada pelo fim do pacto de paz das facções criminosas


 
As transferências dos internos no Complexo Penitenciário Itaitinga II começaram por volta de 9h e seguiram até a noite de ontem ( FOTO: THIAGO GADELHA )
A Secretaria de Justiça e Cidadania do Ceará (Sejus), em parceria com outras instituições, realizou intensa transferência de detentos entre unidades do sistema penitenciário cearense durante o dia de ontem. De acordo com a assessoria de comunicação da Pasta, as mudanças têm o objetivo de "desarticular lideranças e prevenir conflitos nos estabelecimentos prisionais".
Detalhes como a quantidade de presos realocados e em quais unidades aconteceram a operação não foram divulgados pela Secretaria. Entretanto, o foco principal das transferências foi o Complexo Penitenciário de Itaitinga II, que fica localizado no Km 17 da BR-116, no município que dá nome ao complexo que abrange cinco unidades prisionais, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).
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Por lá, as transferências começaram por volta de 9h e seguiram até a noite. De manhã e no início da tarde, veículos do Batalhão de Polícia de Choque (BpChoque) escoltaram ônibus para entrar e sair do Complexo. Familiares dos detentos se reuniram na frente do portão que dá acesso aos presídios, ainda de manhã, para pedir informação sobre a operação, mas não obtiveram sucesso e deixaram o local no fim da tarde.
A Sejus informou que "ao longo da semana, assistentes sociais e equipe do Núcleo de Atendimento aos Familiares de Internos (Nuasf) estarão prontos a receber os familiares e prestar informações sobre para onde os internos foram transferidos". Ainda de acordo com a nota emitida pela assessoria de comunicação, os agentes penitenciários realizaram a operação com o apoio do Ministério Público do Ceará (MPCE), das polícias Civil, Militar e Rodoviária Federal e do Corpo de Bombeiros.
Confronto entre facções
Apesar da Sejus não confirmar, a reportagem apurou com advogados e familiares dos presos que a realocação foi motivada pelo fim do pacto de paz entre duas organizações criminosas que têm atuação em todo o Brasil, inclusive no Ceará: o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV).
Segundo um advogado que preferiu não se identificar e que tem 11 clientes que são membros do PCC e estão detidos no Complexo Penitenciário de Itaitinga II, presos pertencentes a outras facções exigiram aos diretores penitenciários que os integrantes do PCC fossem separados. Parentes que mantém contato diário com os presos afirmaram que o prazo dado pelas organizações criminosas para a divisão era até 0h de hoje. O advogado revelou ainda que os clientes contaram que existiam ameaças de que a Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor Clodoaldo Pinto (CPPL II) e a Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor Jucá Neto (CPPL III), duas das unidades do Complexo, 'iam quebrar' (ou seja, ter rebeliões e possíveis conflitos).
"As outras facções se juntaram contra o PCC, mas o PCC é maioria no Ceará", afirmou o advogado. A guerra que poderia chegar aos presídios cearenses deixou vítimas em outro estado. Entre o último domingo (1º) e segunda-feira (2), 60 presos que seriam do PCC foram mortos em presídios do Amazonas, e os crimes foram atribuídos à organização criminosa Família do Norte (FDN), que teria agido com o conluio de outras facções. Entretanto, a Sejus nega que a transferência de presos no Ceará tenha relação com a rebelião e a chacina ocorridas em Manaus.
O advogado entrevistado acredita que a separação de presos a partir das facções criminosas, criando unidades específicas para cada organização, seria perigoso, caso se confirme. "A massa carcerária que é réu primária vai ser obrigada a entrar em uma facção", apontou.
Familiares dos detentos do Complexo Penitenciário II dividiram opiniões sobre a possível divisão por organizações. A esposa de um preso que não é afiliado a nenhuma facção disse que estava aflita porque o marido já estava acostumado à cela que se encontrava locado e não sabia como seria agora. Já a esposa de outro detento, membro do CV, comemorou a separação e disse que era um desejo antigo do marido e dos seus amigos.
Negativa
O Ministério Público do Ceará (MPCE), através da promotora Joseana França, designada para acompanhar as transferências, afirmou que os presos não foram divididos por facções, e sim realocados para ocupar parte da Casa de Privação Provisória de Liberdade Agente Elias Alves da Silva (CPPL IV) que estava sendo reformada. "É uma acomodação que a Sejus fez, que já era prevista pela direção dos presídios. Coincidiu de acontecer logo após esse fato de Manaus".
Segundo a promotora, não existiu imposição das facções criminosas sobre o Estado para acontecerem as transferências. "A gente tem a preocupação de combater esses grupos, mas de outra forma. Nós fazemos o acompanhamento, junto com as direções das unidades, um trabalho coeso, que não se submete às facções", explicou.( Diário do Nordeste )

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