João Tavares - presidente da MFPC - com a mulher, a sogra, as filhas e a neta |
João Tavares é um dos 35 padres maranhenses que deixaram o exercício do ministério sacerdotal para casar e constituir família e hoje integra a Associação Rumos, órgão que representa os mais de cinco mil padres casados do Brasil e suas famílias, que formam o Movimento das Famílias dos Padres Casados (MFPC).
O padre conta que, mesmo após deixar a batina para casar, o sacerdote, segundo o Código Direito Canônico, continua com poder de Ordem, ou seja, nunca deixa de ser padre e, portanto, se celebrar missa ou outros sacramentos, eles são válidos, mas sem o Exercício legítimo dele.
“Oficialmente, o padre casado só pode exercer esse poder em casos extraordinários prescritos pelo Direito Canônico ou pela necessidade urgente dos fieis, já que, como diz o Cânone 1752, o último do Código, ‘a salvação das almas, na Igreja, deve ser sempre a lei suprema’. Sendo assim, em caso de necessidade, o padre casado pode celebrar qualquer sacramento. E é lícito e válido”, explica.
Tavares conta ainda que já há no Brasil e em outros países, casos em que o bispo encarrega um padre casado de uma paróquia, com todos os poderes sacerdotais. Mesmo, assim, segundo ele, pela prática da quase totalidade dos bispos, a função dos padres casados é quase nenhuma, menos ainda que a de um leigo.
De acordo com o padre, se os bispos fossem mais corajosos, “menos carreiristas e mais obedientes ao Evangelho e ao Espírito Santo do que à Cúria Romana”, muitos padres casados poderiam estar ajudando à Igreja Católica no Brasil e no mundo e ajudar a amenizar, o que muitos padres e leigos chegam a definir como uma “escassez de padres”. Tavares conta que, hoje no Brasil, há um padre para cerca de 6 mil católicos, ou um para cada 10 mil habitantes, porém não dá para dizer se isso é pouco ou muito, pois não há um critério que defina o número ideal de padres.
“Tenho a impressão que vários bispos não têm bem noção do real poder que têm em suas dioceses, onde ele é pastor por direito próprio, não por delegação do papa ou da Cúria romana. Eles são sucessores dos Apóstolos, não delegados de Pedro ou, pior, do Núncio Apostólico... na prática, há vários e bons padres casados fazendo muita coisa na Igreja de Jesus Cristo, que vai bem além da Igreja Católica”, comenta.
Celibato
Na opinião de João Tavares, o melhor seria o celibato fosse opcional, pois segundo o padre, ele nada tem a ver com o sacerdócio, seriam coisas distintas, e uma não tem nada a ver com a outra. Ele diz ainda que o fim do celibato ou a revisão dessa questão, com a flexibilização, ajudaria a aumentar o número de padres na Igreja.
“Com toda a certeza aumentaria. Uma outra alternativa, seria ordenar homens casados, com caminhada na Igreja e bom conceito na Comunidade. Há um movimento recente nesse sentido, talvez a começar pela Amazônia”, opina.
O celibato, imposto pela Igreja Católica no século 12, simboliza o triunfo do espírito sobre a carne. A premissa é de que apenas a dedicação total à Igreja faz um padre. Em 1073, o papa Gregorio VII impôs o celibato. Definiu-se que o matrimônio dos sacerdotes era herético, porque os distraía do serviço ao Senhor e contrariava o exemplo de Cristo. Dezenas de historiadores supõem que a decisão de impor o celibato foi também um meio para evitar que os bens dos bispos e sacerdotes casados fossem herdados por seus filhos e viúvas em vez de beneficiar à Igreja. Em 1123 o Concilio de Letrán decretou a invalidade do matrimônio dos clérigos e, dezesseis anos mais tarde, o segundo Concilio de Letrán confirmou.
A Igreja
De acordo com o padre Crizantôno da Conceição Silva, coordenador de Pastoral da Arquidiocese de São Luís, o celibato foi instituído para que o padre dedicasse a vida à Igreja por completo. Segundo ele, entende-se que sem família o vocacionado terá mais tempo para se dedicar integralmente à vida religiosa, pois uma vez que ele é casado terá as preocupações com a vida familiar.
Mesmo assim, de acordo com o padre, o celibato não é um dogma de fé, sendo assim não é um problema para a Igreja, que vem fazendo uma profunda análise sobre a o mesmo.
“O celibato não é algo que oprime, mas que motiva a entrega total à vocação. Também não significa desprezo da Igreja pelo matrimônio. Quando um vocacionado aceita a missão de ser padre, ele tem consciência da doação por completo à Igreja”, comenta.
O padre diz ainda, que a exigência do celibato não está ligado à possível “escassez” de padres e diz que, mesmo que os sacerdotes que deixaram a vida religiosa para casar, voltassem a exercer todas as funções eclesiais, não supriria a necessidade de padres que há na Igreja.
Associação dos padres casados
Fundada em 16 de Agosto de 1986, na cidade de Brasília, Distrito Federal, a Associação Rumos congrega padres oriundos da Igreja Católica Romana no Brasil que deixaram o exercício do ministério sacerdotal para casar. A organização tem o papel ser o suporte jurídico do Movimento das Famílias dos Padres Casados do Brasil (MFPC).
De acordo com o padre João Tavares, a associação não é vinculada juridicamente à estrutura da Igreja Católica. Apesar de serem mais de 99% católicos praticantes, segundo ele, são independentes dos bispos e do papa, como instituição. A diferença, de acordo com Tavares, é que não comungam, necessariamente a mesma visão política e pastoral da Hierarquia. Sobretudo, não a mesma visão de autoridade, poder e serviço.
“Nossa relação institucional com o papa e os bispos é de independência, mas também de busca do diálogo possível. Estamos sempre abertos ao diálogo construtivo com eles e já o vimos tentando há décadas. Só que, infelizmente, eles não estão interessados neste diálogo. Salvo raras exceções. Somos uma pedra no sapato deles, um desafio contínuo às velhas estruturas de poder e de abuso de poder na Igreja. Francisco está se mostrando aberto e preocupado com o assunto, mas ainda tem muitas coisas mais urgentes a fazer e a resolver”, explica.( O Imparcial )
Nenhum comentário:
Postar um comentário