José Sarney
R7 – Foi numa conversa no Hospital de Base em Brasília que a história do Brasil dos últimos 30 anos foi traçada. Ainda muito abalado com a doença do recém-eleito presidente Tancredo Neves, o então vice José Sarney precisou ser convencido por Ulysses Guimarães de que deveria assumir a Presidência. Surpreendido pela evolução do quadro clínico do colega de chapa e amigo, Sarney hesitava.
Primeiro porque nunca havia se imaginado naquela situação e, depois, porque havia uma pressão enorme em torno do nome de Ulysses Guimarães, figura carismática dentro do partido.
— Quando eu soube [da situação] no hospital, o Ulysses foi o primeiro que me disse: “Olha, Sarney, nós estamos diante de uma situação grave e temos que enfrentá-la. Você vai ter que assumir o governo amanhã”. Eu disse: “Ulysses, eu não desejo assumir. Eu vou esperar para assumir junto com o Tancredo, porque será uma decepção para o povo brasileiro que, ao invés do Tancredo, venha eu a assumir”. Aí ele disse: “Não, tem que ser você. Nós já temos grandes problemas. A Constituição determina que seja você e eu não vou discutir”.
No ano em que completa 85 anos de vida, 60 deles na política, Sarney comemora junto com o Brasil os 30 anos da redemocratização. Em clima de celebração e de despedida da política — Sarney não disputou as últimas eleições ao Senado — o ex-presidente foi categórico ao ser questionado sobre qual seria a marca de sua gestão na Presidência e de sua carreira política.
— A grande marca da minha vida foi a transição democrática. Eu acho que a transição democrática foi a única [no mundo] que mais durou e não deu problemas em seguida. A nossa Constituição até hoje sobrevive sem nenhum problema institucional e cada vez mais o Brasil se torna uma grande democracia. Eu acho isso extraordinário.
Os desafios eram enormes. Além da delicada situação política, o País vivia também uma complicada situação econômica, recessiva após os 21 anos de ditadura. Mesmo com o enorme esforço e a execução de diversos planos econômicos para conter a hiperinflação — Cruzado, Cruzado Novo, Bresser e Verão —, o ex-presidente avalia a situação política como a mais desafiadora na Presidência.
— O [maior desafio foi] político, porque nós saíamos do Regime Militar para entrar num regime de Estado de Direito, sem ter nenhum problema institucional, sem ter nenhum problema militar, e nós conduzirmos com absoluta tranquilidade dentro da eleição, fazendo uma Constituinte, restaurando o Estado de Direito em sua plenitude e termos no final do governo um operário candidato à Presidência da República e um adversário do presidente ganhando a eleição.
Grande parte desse mérito, o ex-presidente atribui ao temperamento como político de discussão e conciliação.
— Eu sempre fui um democrata e, como democrata, sempre tive a consciência que não sou o dono da verdade. Sou um homem do diálogo. Sou um homem de compreender as posições que as outras pessoas têm o direito de ter. Respeitar o ponto de vista dos outros e procurar sempre através do consenso resolver os problemas. Foi assim que eu contribuí em diversas crises do País.
Ataques políticos
As críticas que recebe, principalmente em relação às administrações do seu Estado de origem e berço político, o Maranhão, o ex-presidente minimiza e diz que são ataques políticos.
— Eu respeito como a politicagem que é aquela do Maranhão com dados mentirosos. O Maranhão é 17º Estado do Brasil. Está na frente do Mato Grosso do Sul. Cada vez mais o seu PIB sobe. Ele é o segundo porto do País. A maior fábrica de celulose, de alumínio. Uma politicagem que é feita para me atingir. Como não podem me atingir porque a minha vida política durante todo esse tempo tem sido de dedicação ao País e atravessei 60 anos de parlamento. Eles não podem me atacar, atacam o Maranhão.