Paulo Nogueira (Diário do Centro do Mundo)
Michael Gove, ministro da Educação do Reino Unido, é um conservador. Faz parte do gabinete do premiê David Cameron. Não há nele, portanto, nenhum resquício do que o PIB (o Perfeito Idiota Brasileiro) classificaria de esquerdismo.
Considere, diante disso, o que Gove disse a respeito da mobilidade social entre os britânicos. Gove colocou o foco na educação. Apenas 7% dos britânicos são educados em escolas privadas. São os filhos das famílias ricas, é claro.
O que acontece, então? Os alunos saídos das escolas particulares têm, na vida adulta, imensa vantagem sobre os demais. “Mais do que em quase todo país desenvolvido, na Inglaterra o berço dita o progresso da pessoa”, disse Gove. “Aqueles que nasceram pobres provavelmente permanecerão pobres e aqueles que herdaram privilégios provavelmente transmitirão os privilégios a seus filhos. Para aqueles de nós que acreditam em justiça social, esta estratificação e esta segregação são moralmente indefensáveis.”
Justiça social? Nosso PIB tremeria diante dessa expressão de comunistas ateus que comem criancinhas e amordaçam a “imprensa crítica”, para usar a nova e engraçada expressão usada pela Folha de S. Paulo. E correria para ler o que Reinaldo Azevedo diz sobre “justiça social”, para se sentir protegido e reassegurado em suas convicções.
Mas atenção. Michael Gove é, repito, conservador, exclamação. Jornalista de formação, articulista do Times, de Murdoch, Gove é 100% capitalista.
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CAPITALISTAS
Mas, ao longo da história, muitas vezes homens públicos liberais como Gove se viram na obrigação de defender o capitalismo dos capitalistas.
Ted Roosevelt, presidente americano do começo do século 20, foi um caso clássico. Ele inaugurou a chamada Era Progressista, nos Estados Unidos, ao longo da qual os monopólios foram desfeitos e os direitos dos trabalhadores e dos negros começaram a ser afirmados.
Seus amigos magnatas reclamaram dele, e Roosevelt lamentou, certa vez, que eles não percebessem que ele estava agindo em benefícios dos queixosos mesmos, para evitar transtornos sociais que poderiam levar à esquerdização do país.
O Instituto Millenium, reduto da vanguarda do atraso nacional, poderia ouvir Michael Gove. O Millenium, uma espécie de Tea Party caipira, fala em meritocracia, mas como você pode falar nisso, sem cair no ridículo, quando você vive num país cuja transmissão de privilégios pela via da educação em escolas privadas é muito maior do que aquela descrita pelo ministro da educação da Inglaterra?
Considere agora. Onde está esse debate no Brasil? Me refiro à perpetuação de privilégios pelo berço e pela escola, e pela intrínseca negação à meritocracia encerrada nela?
Em nenhum lugar? Talvez fosse o momento então de iniciá-lo.
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