sábado, 15 de abril de 2017

A força do Perdão



Sentimento libertador


Maria Dolores

 
Quantas vezes repetimos: "isto é imperdoável" ou "isto não tem perdão". Dependendo do ponto de vista de cada pessoa, existem coisas que realmente não dá para perdoar. Será? Imaginem a dor de uma mãe ao perder o filho assassinado covardemente? E a esposa traída pelo marido com a melhor amiga?
São casos extremamente dolorosos que, a princípio, não seriam dignos de serem perdoados. Entretanto, se desviarmos do caminho que leva ao perdão, dificilmente deixaremos de acumular raiva, mágoa, ódio e desejo de vingança, sentimentos capazes de desencadear problemas ainda mais sérios.


Está comprovado cientificamente que o "não perdão" pode refletir doenças psicoemocionais e físicas, explica a irmã Socorro Dantas, coordenadora nacional, pela Região Nordeste, da Escola de Perdão e Reconciliação (Espere). "Existem pessoas que sentem dores no corpo, desenvolvem doenças estomacais, nervosas e até de depressão por estarem presas a uma situação traumática e por não conseguir liberar o perdão".
O perdão, acrescenta a irmã, é um processo de libertação, libertação das amarras, e de tudo aquilo que deixa a pessoa mergulhada na dor, no sofrimento, presa a alguém, ou presa a um trauma. Segundo ela, o processo começa quando o indivíduo compreende o que o deixava preso e cada vez mais vítima de uma situação de dor. A partir dessa convicção, a tendência é que ele se libere e passe a superar o sofrimento, compreendendo que o caso que tanto o incomoda não faz mais parte de sua vida.
Marina (nome fictício) viveu experiência semelhante neste processo de perdão. Após passar a infância sendo agredida pelo pai, cresceu sem conseguir esquecer os episódios de dor dentro da própria casa. "Minha mãe também era vítima, mas sempre ficava em silêncio, até o dia em que ela decidiu fugir comigo e com minhas irmãs menores para o Ceará", recorda. Durante muitos anos, guardou mágoas do pai, mas recentemente decidiu procurá-lo. Descobriu o telefone e entrou em contato com ele. "Foi muito bom pra mim. A gente conversou bastante, chorou e depois se perdoou", fala com alívio no coração. Relata, ainda, que o mesmo não aconteceu com sua mãe, pois até agora não superou os ressentimentos.
O processo de perdão de Marina, 46 anos, começou logo no primeiro encontro de capacitação da Espere, realizado em Pacatuba, na Região Metropolitana de Fortaleza, no início deste ano. Ela reconhece que levou muito tempo para compreender o problema. Já adulta, casada e com uma filha adolescente, diz que vem aprendendo a se colocar no lugar do outro e isso tem ajudado muito em diversos aspectos de sua vida.
Essa leveza que Marina encontrou a partir do perdão do pai, ainda não faz parte da realidade de Ricardo (nome fictício), 39 anos. Desde criança, sempre gostou dos brinquedos de menina e logo percebeu que não iria se relacionar com mulheres. Aos 25 anos, assumiu ser gay para a família. A mãe, à época, ficou triste, entretanto, aos poucos, foi aceitando. O pai simplesmente não quis mais saber do filho. "Eu sofri e sofro muito com a rejeição dele, mas tento me colocar no lugar do meu pai. Ele é uma pessoa humilde e nunca frequentou a escola, talvez por isso não consiga me entender".
O que mais o deixa magoado é saber que o pai fala na pequena cidade que preferia ter um filho bandido ao invés de gay. Ricardo, contudo, não se intimidou com o desprezo, estudou, formou-se e hoje é professor e vereador em sua cidade, no Interior do Ceará. "Por algum tempo, meu pai proibiu até as minhas irmãs de falarem comigo, entretanto, isso não acontece mais", destaca. O sonho de Ricardo é ser perdoado pelo pai e, quem sabe, voltar a comemorar as festas de fim de ano com toda a família e em harmonia. Enfim, em paz, assim como já aconteceu com Paulinha, Dolores e Maria de Lourdes. Nos depoimentos a seguir, elas revelam como ocorreram as suas libertações.

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