Os lamentáveis incidentes da última quarta-feira (24) nas manifestações sociais em Brasília, que ensejaram a edição de um decreto presidencial de uso das forças armadas para a garantia da lei e da ordem, nos colocam num profundo estado de reflexão. A violência está travestida, ora pela brutalidade da mão empunhada, ora pela edição de atos legais que transfiguram o cumprimento dos direitos individuais e sociais previstos na Constituição Federal. A reforma da Previdência, consubstanciada na PEC 287/16, é a personificação clara da violência que o governo impõe, autoritariamente, ao povo brasileiro.
Urdida entre quatro paredes, com discutível embasamento técnico, de cunho estritamente fiscalista, a reforma atinge os direitos de todos – atuais empregados públicos e privados, aposentados, beneficiários de programas sociais, trabalhadores do campo – em estrito cumprimento ao limite de gastos, favorecendo o já tão próspero mercado financeiro.
A tramitação em tempo recorde na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, com impedimento a participação popular, já prenunciava o que viria. Várias inconstitucionalidades foram apontadas na proposta. Anfip, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), movimentos sindicais, juristas, economistas, todos bradaram e ainda bradam para que o Brasil não seja apunhalado por essas medidas. Aí aconteceu o pior.
O governo, em vez de viabilizar uma discussão técnica eficiente, banca um substitutivo que não incorporou as contribuições dos deputados e piorou ainda mais as regras, especialmente para os servidores públicos. Para tentar “dourar a pílula”, gasta milhões de reais em publicidade oficial, mentindo, enganando, ludibriando a população, numa evidente violação, mais uma vez, dos preceitos legais.
Há que se fazer uma profunda reflexão sobre a maneira correta de se encaminhar uma reforma da Previdência. Ela deveria ter sido fruto de um processo de negociação efetivo entre todas as partes. Os trabalhadores, os empresários, os aposentados e a sociedade civil, que também paga suas contribuições sociais, deveriam ser chamados a opinar.
São essas mazelas que demonstram claramente que estamos hoje vivenciando uma crise de representação. A nossa classe política, envolvida em sua grande maioria em problemas com a Justiça, não tem mais legitimidade para legislar sobre assuntos que digam respeito aos direitos sociais em risco de extinção e à vida de todos os brasileiros.
É necessário que se resolva definitivamente a crise política, pois sem essa solução não há a menor condição de se debater assuntos de tamanha relevância e importância para a vida dos brasileiros, como as reformas trabalhista e a previdenciária.
Previdência não pode jamais rimar com violência. Previdência tem que rimar com inclusão, com justiça, com promoção social. A Constituição Federal nos garante uma Previdência pública de qualidade, que redistribua renda, que proteja os necessitados. Que ela continue a ser executada dentro dos preceitos da seguridade social, como tem sido ao longo dos anos. Ela também pode e deve ser aprimorada, com melhorias na gestão, como aquelas que cobrem dos devedores o que devem e estabeleça a compensação imediata das renúncias previdenciárias. Jamais ser renegada ao segundo plano ou ser apontada como a causa da grave crise econômica pela qual passa o Brasil.( Congresso Em Foco )
Nenhum comentário:
Postar um comentário