quinta-feira, 1 de abril de 2021

Santos Cruz reprova tentativa de politizar Forças Armadas: “O único projeto que nós vemos é de reeleição”

 

 

Cruz diz que instituições não servem a jogo de poder e interesses pessoais

Fernanda Strickland
Correio Braziliense

Ministro-chefe da Secretaria de Governo de janeiro a junho de 2019, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz repudia os movimentos de politização das Forças Armadas, uma das razões alegadas para a demissão do general Fernando Azevedo e Silva do Ministério da Defesa.

“As FAs não são instrumento de intimidação política, pressão política, de projeto de poder pessoal”, afirmou, em entrevista ao programa CB.Poder, parceria entre o Correio e a TV Brasília. Ele também criticou a falta de transparência na reforma ministerial promovida pelo Planalto na segunda-feira. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O presidente Jair Bolsonaro surpreendeu tirando o general Fernando Azevedo do Ministério da Defesa. Os comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica também serão substituídos. O que isso representa?
Reforma ministerial acontece. O que surpreendeu foi a saída repentina do ministro da Defesa e o anúncio da troca dos comandantes. O que é um direito, mas chama a atenção o motivo pela qual é feita.

Na sua opinião, qual é o motivo?
Penso que o governo deveria dizer o porquê. A população tem o direito de ser informada. Agora, se for pelo motivo que vem sendo ventilado, que é alinhamento político, comportamento político das Forças Armadas, nós estamos em um campo extremamente perigoso, que não pode acontecer, como a politização partidária das Forças Armadas.

Estamos caminhando para a politização das Forças Armadas?
Não sei se caminhando para isso, mas se existe esse desejo, isso aí é abuso inaceitável da politização das Forças Armadas. As FAs não são instrumento de intimidação política, pressão política, de projeto de poder pessoal.

Na reunião de comandantes militares com o novo ministro da Defesa, Braga Neto teria dito que ‘missão dada, missão cumprida’, especula-se que se refere à questão de Bolsonaro querer que as FAs ajudem no que ele considera “missão de permitir a circulação dos brasileiros, sem lockdown”. Isso é possível?
Primeiro lugar: esse negócio de missão dada, missão cumprida, eles têm de dizer qual é a missão, para nós entendermos. Se não me diz qual é, ficamos na especulação. Outra coisa que eu vejo é que o Exército não é instrumento para resolver questões políticas nem jurídicas. Então, se você tem diferença com o governador, resolva com o governador, não tem nada a ver com as Forças Armadas. Nós temos assistido, há muito tempo, a que qualquer desavença, crise entre Poderes, o Executivo já fala em Forças Armadas. Foi uma distorção ou é uma falta de capacidade política de resolver as coisas.

Julga que Bolsonaro estava preparado para o cargo?
A campanha política é o momento em que os candidatos fazem suas colocações. Infelizmente, não tivemos muitas colocações, porque não houve debates qualitativos, até devido ao atentado à vida do atual presidente. Não teve discussões qualitativas, foi apenas uma briga ideológica. Bolsonaro falou o que a população queria ouvir, como o combate à corrupção, Lava-Jato, Sergio Moro, criminalizar a política. Mas ele não disse como ia fazer, porque não houve esse tipo de discussão.

A campanha foi rasa ?
Muito rasa, então, quando começou o governo, a prática mostrou que não tinha um projeto sólido. Ele tinha uma ideia, mas não um projeto. O único projeto que nós vemos é de reeleição.

A reforma ministerial, agora, teria um objetivo de ajudar o residente a se reeleger?
Na área política, sim — uma nova ministra na Secretaria de Governo para ter articulação política, porque isso tudo são arrumações políticas. Agora, nessa parte de Forças Armadas, não tem sentido vincular apoio político com reforma em comando de Forças Armadas. Tem muita gente dizendo que ele mudou, também, as Forças Armadas com o seguinte raciocínio: ‘Olha, se der errado na política, eu me sustento com o Exército, a Marinha, a Aeronáutica e posso partir para o enfrentamento com os governadores, colocando os exércitos nas ruas para garantir a livre circulação das pessoas. O que garante a sustentação política dele são seus eleitores. Agora, você tem de governar. Forças Armadas não são para sustentação política.

Há uma mensagem rodando nas redes sociais que diz “Força Brasil”, convocando as pessoas para amanhã (hoje), aniversário do movimento de 1964, fazer um chamamento militar na frente dos quartéis, pedindo intervenção militar, com Bolsonaro no comando. Como o senhor vê isso?
Não tem sentido. Se quer comemorar, por considerar que vale a pena, por ser um seguidor e gostar do que aconteceu, pensou que o Brasil viveu um período necessário, não tem problema. Agora, você exigir e querer uma nova intervenção militar com Bolsonaro no poder é desconectado da realidade. As FAs não são ferramentas de aventura política.

Uma crise militar está perto?
Acredito que não, porque os comandantes, todas essas pessoas que estão na fila para os cargos, são altamente preparados, com formação e mentalidade institucionais e têm convicção do prejuízo que é o envolvimento político das Forças Armadas. Sabem que as Forças Armadas não estão aí para se comprometer com jogo de poder e interesses pessoais, políticos etc.

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