quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Bolsonaro adia filiação partidária porque o seu projeto está mais nas armas do que nas urnas

 

 

Charge do Duke (domtotal.com)

Pedro do Coutto

Por incrível que pareça, o presidente Jair Bolsonaro permanece sem filiação partidária e, até o momento, não parece disposto a encontrar uma nova legenda para nela ingressar e assim concorrer às eleições de outubro do próximo ano. Reportagem de Jussara Soares, O Globo desta terça-feira, focaliza a questão e assinala que Bolsonaro foi aconselhado por Ciro Nogueira, chefe da Casa Civil a somente reingressar no sistema partidário no final do primeiro semestre de 2022.

Para mim, uma situação confusa, pois a menos que tenha havido mudança, os candidatos, todos eles, necessitam ter um ano de inscrição partidária antes das eleições. O prazo assim termina, na minha impressão, em 3 de outubro de 2021, portanto a pouco mais de um mês. Jussara Soares acentua que Ciro Nogueira sugeriu a espera de mais seis meses para que possa ser feita uma avaliação melhor pelo atual presidente da República, uma vez que, pela pesquisa do Datafolha, ele foi considerado ruim e péssimo por 51% do eleitorado. O levantamento é do mês de julho, portanto feito há 60 dias. Em outubro de 2020, o índice negativo era de 31 pontos. Portanto, avançou vinte escalas percentuais. Mas, não é essa questão essencial.

DOIS CAMINHOS –  A questão essencial é que o poder não pode permanecer vago em lugar algum do mundo e os exemplos da história universal estão aí para demonstrar. E, para chegar ao poder, outro exemplo irredutível, o de que só há dois caminhos a se seguir, o das urnas, nas democracias, ou o caminho das armas, nas ditaduras. Ao que parece, a resistência em ingressar em uma legenda por parte de Bolsonaro é para que ele não se comprometa com o voto popular e deseje um desfecho militar.

Tanto é assim que o documento da Fiesp que apenas se baseia no compromisso com a Constituição, com as eleições e com a democracia, criou mal estar junto ao chefe do Executivo. A Fiesp, segundo o seu presidente Paulo Skaf, adiou o documento, conforme dito, até o final desta semana. Porém, os empresários do agronegócio, reportagem de Fernanda Trisotto e Henrique Gomes Batista, O Globo, não adiaram o seu posicionamento e colocaram na imprensa um manifesto contra o risco de retrocessos institucionais ao mesmo tempo em que exalta a democracia e coloca em foco totalmente claro o respeito ao voto e à Constituição do país.

Alguém pode ser contra a Constituição do país, contra o voto ou contra a democracia? É a pergunta que faço. Assim, se alguém reage mal a tais colocações, que têm o apoio de mais de 80% do eleitorado brasileiro, é porque no fundo da questão está tentando trilhar um caminho oposto na certeza de que a estrada do voto não o levará, no caso de Bolsonaro, ao desfecho igual ao que as urnas de 2018 lhe proporcionaram. Não pode haver outra interpretação. Da mesma forma que ninguém pode ser contra a água potável ou a alimentação sadia, não se pode acreditar na sinceridade de quem se irrita quando se fala em Constituição democrática e no direito de voto popular.

RECUO  –  Relativamente ao recuo da Fiesp, de acordo com Ivan Martínez-Vargas, Geralda Doca e Renata Andrade, também no O Globo, o adiamento adotado por Skaf resultou de um pedido feito pelo presidente da Câmara dos Deputados, deputado Arthur Lira, para que o documento só venha a ser veiculado após o dia 7 de setembro, quando haverá no país manifestações de apoio e manifestações  contrárias ao governo federal. Entretanto, Skaf ao dizer que poderá liberar o texto até sábado dá a impressão de não concordar com o adiamento até a comemoração da Independência do país.

Além desse aspecto, Eduardo Sodré e Paula Soprana, Folha de S. Paulo, revelam que o adiamento criou decepção junto à maioria das entidades industriais, dando margem para que a direção da Fiesp possa ser acusada de covardia e de falta de empenho em legitimamente representar a classe empresarial, sobretudo porque mais de duzentos setores da indústria assinaram o documento e grande número dos que ainda não tinham firmado se mostraram dispostos a fazê-lo. Entre os setores industriais que demonstraram temor, surpreendentemente encontra-se a Firjan, uma vez que o Rio de Janeiro é o segundo centro industrial do Brasil.

SALÁRIO MÍNIMO –  O governo Bolsonaro anunciou na tarde de terça-feira que o salário mínimo a partir de janeiro de 2022 passará a ser de R$ 1170, 5% acima do valor atual. Ocorrem dois aspectos. Primeiro que se a inflação de 2021, aliás como se espera, superar os 5%, o salário mínimo estará de fato sendo reduzido, perdendo portanto ainda maior valor de compra.

Em segundo lugar, se o salário mínimo cai sobre 5% e os demais salários sobem zero por centro, fica evidente que o número dos que no Brasil recebem o piso básico vai aumentar ainda mais. Um terceiro ângulo da questão pela lei em vigor, o reajuste percentual do salário mínimo inclui os aposentados e pensionistas do INSS que assim vão ter os seus vencimentos nominalmente aumentados a partir do próximo ano.

Pela lei do país, a atualização dos orçamentos federais será feita também com base no percentual inflacionário achado pelo IBGE. Não sei porque o jornalismo econômico, tanto no O Globo, quanto na Folha de S. Paulo e no Estado de S. Paulo, não citam os valores absolutos sobre os quais os valores percentuais incidem. A parte tributária é uma coisa, é uma fração orçamentária, mas está longe de ser o valor total do orçamento.

ENDIVIDAMENTO – No Jornal Nacional de segunda-feira, a TV Globo informou que em dez famílias brasileiras, sete encontram-se endividadas em maior ou menor escala. A comparação, portanto, representa 70% da população, uma vez que cada família tem uma média de 4,2 pessoas. O endividamento, acentuou a TV Globo, atinge R$ 426 bilhões sobre os quais incide em média juros anuais de 28,8%. Assim, com os salários congelados é absolutamente impossível que a sociedade brasileira possa saldar o montante de seu endividamento.

Só poderá fazê-lo rolar como uma bola de neve. Mas até que ponto esse processo rotativo será possível ? A fome é um dos maiores flagelos da humanidade  e a situação brasileira foge à regra.

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