Por: Bruna Sampaio
Pouco após as 10h, o caminhão estaciona na Glória, Zona Sul do Rio. Minutos depois, a fila se forma. É que já havia gente esperando o veículo, que recolhe ossos e pelancas de supermercados da cidade. Sensibilizados, motorista e ajudante da empresa doam ali toda terça e quinta parte do que foi recolhido. Diante do desemprego — que ficou em 14,1% no segundo trimestre de 2021, atingindo 14,4 milhões de brasileiros — e da inflação galopante — que com a prévia deste mês chegou a 10,05% no acumulado em 12 meses, ultrapassando os dois dígitos pela primeira vez desde fevereiro de 2016 —, é a esperança daquelas pessoas de encontrarem um pedaço de carne para matar a fome.
Uma vez por semana, a desempregada Vanessa Avelino de Souza, de 48 anos, que mora nas ruas do Rio, caminha até o ponto de distribuição. Com paciência, separa pelanca por pelanca, osso por osso em busca de algo melhor para pôr na sacola. — A gente limpa e separa o resto de carne. Com o osso, fazemos sopa, colocamos no arroz, no feijão... Depois de fritar, guardamos a gordura e usamos para fazer a comida — explica Vanessa, que lamenta não conviver com os cinco filhos.— Não tenho como cuidar deles. Por isso, eles são criados pela minha mãe. Não temos quase nada. O que temos é de doações. Lá, pelo menos, eles têm um pouco de dignidade.
Na fila da fome, Vanessa não está só. Outras mulheres, homens e jovens se amontoam em busca do restolho da carne e dos ossos. A pobreza extrema, que leva pessoas a garimpar restos, foi acentuada no Brasil durante a pandemia de Covid-19. Levantamento da Rede Brasileira de Pesquisas em Segurança Alimentar e Nutricional mostrou que mais de 116,8 milhões de pessoas vivem hoje sem acesso pleno e permanente a alimentos. Dessas, 19,1 milhões (9% da população) passam fome, vivendo “quadro de insegurança alimentar grave”. Os números revelam um aumento de 54% no número de pessoas que sofrem com a escassez de alimentos se comparado a 2018.
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