Pedro do Coutto
Na Câmara, a oposição liderada pelo deputado Alessandro Molon e o mínimo de bom senso quanto ao direito das pessoas resistem ao projeto de emenda constitucional que adia não se sabe para quando o pagamento de precatórios decorrentes de ações integralmente transitadas em julgado. O deputado Arthur Lira, presidente da Câmara Federal, vacila em colocar ou não na ordem do dia a proposição que representa um retrocesso de trinta anos no direito consolidado, pois é este o tempo médio em que os titulares dos precatórios levam para receber os valores neles fixados.
Quem ajuizou, por exemplo, uma ação judicial em 1989, está recebendo seu crédito agora em 2021, portanto trinta e dois anos depois. A reportagem sobre a tramitação do projeto é de Thiago Resende, Danielle Brant e Washington Luís, Folha de S. Paulo de ontem. No momento em que escrevo esse artigo havia dúvida se Arthur Lira colocaria a matéria na pauta ou se a adiaria novamente. A votação chegou a estar prevista para terça-feira, mas sentindo que o governo não teria os 308 votos necessários, Arthur Lira resolveu jogar com o tempo e com a capacidade que às vezes o governo Bolsonaro tem de mudar a consciência dos parlamentares.
RESISTÊNCIA – De qualquer forma, a tramitação da matéria encontra dificuldades na Câmara e não adiantará muita coisa se vier a ser aprovada nesta Casa porque a resistência por parte do Senado é também muito grande. Trata-se de uma questão não só de lógica, mas de respeito aos direitos humanos. O governo quer buscar recursos de qualquer maneira para pagar já em novembro a parcela mensal do Auxílio Brasil.
Mas, no caso projetado, a ideia sinistra é a de retirar recursos das pessoas que venceram ações judiciais para cobrir um programa assistencialista do governo. Uma grande parte das ações contidas nos precatórios, resulta de condenações aplicadas ao INSS. Quer dizer, o governo tenta distribuir recursos a quem nunca contribuiu para a Previdência Social em prejuízo dos direitos daqueles que contribuíram a vida inteira e hoje são aposentados.
O governo precisa encontrar, na minha opinião, outra fonte de transferência de renda, pois transferir renda do trabalho para a assistência social não acrescenta nada ao país. O que acrescenta, isso sim, seria a transferência do capital para o trabalho. Mas a figura de Paulo Guedes encontra-se sempre presente ao que se refere a cortar os salários e liberar os preços, equação que está levando à fome a milhares de brasileiros.
CPI DO SENADO – O senador Omar Aziz, presidente da CPI do Senado que apurou erros e omissões do governo Bolsonaro em relação à Covid-19, entregou o relatório final ao procurador-geral da República, Augusto Aras, para que ele tome providências, entre elas a de investigar a procedência de denúncias que envolvem o presidente da República.
Dificilmente, Augusto Aras dará sequência ao relatório. Sobretudo porque é candidato à vaga de Marco Aurélio Mello, no Supremo Tribunal Federal, uma vez que está flagrante a rejeição ao nome de André Mendonça. A charge de Chico Caruso na primeira página no O Globo de ontem acentua com forte dose de humor o bloqueio ao nome de Mendonça. O apoio dos evangélicos de Silas Malafaia à indicação de Mendonça não está surtindo efeito. Mas essa é outra questão. ]
O fato é que Augusto Aras não se encontra confortável em determinar investigações envolvendo o presidente Bolsonaro e integrantes de sua equipe. Mas não se sente igualmente desconfortável em não dar sequência ao relatório da CPI. No O Globo, Nathália Portinari, Aguirre Talento, Julia Lindner e Bruno Góes, destacam e analisam a questão.
TORCIDA – No fundo, o próprio Augusto Aras torce para que o Senado, como alguns senadores cogitam, ingresse diretamente na Corte Suprema sem passar pela PGR, pois assim a CPI teria chance de avançar no campo concreto sem que ele, Aras, corra o risco de se incompatibilizar com o Palácio do Planalto.
Aliás, digo, na realidade não precisa realizar investigação alguma. As acusações desfechadas a Bolsonaro e a integrantes de sua equipe, especialmente no Ministério da Saúde, já se encontram definitivamente configuradas. Basta exibir os vídeos existentes e as situações neles focalizadas.
Nas duas últimas semanas, o presidente Bolsonaro gravou lives sustentando uma vinculação entre as vacinas contra a Covid-19 e a Aids. Não há necessidade, portanto, de qualquer investigação, basta exibir o filme. Da mesma forma, os filmes existentes sobre a sequência de ações do governo despropositadas e que agravaram a consequência mortal da pandemia.
AUXÍLO BRASIL – Na Folha de S. Paulo, Ranier Bragon e Danielle Brant focalizam a distribuição dos R$ 400 do Auxílio Brasil a partir do mês que se inicia na próxima semana. Chegam à conclusão de que os recursos disponíveis, a meu ver aparentemente disponíveis, não vão garantir a alimentação para os mais pobres, sobretudo em consequência do novo impacto do aumento da gasolina e do óleo diesel. Aliás, o programa substitui o Bolsa Família no qual encontram-se cadastradas 14,4 milhões de unidades familiares, totalizando cerca de 55 milhões de pessoas.
Mas, como poderá ser feita a distribuição fora do cadastro do Bolsa Família? Era indispensável que fosse feita uma listagem enorme de pessoas em grau de miserabilidade. Mas isso não foi sequer realizado. Assim o governo está na véspera de uma distribuição de recursos que em muitos casos ainda não têm nomes e endereços.
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