Pedro do Coutto
Ao discursar no evento que marcou seu ingresso no PL, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que as cores verde e amarelo da bandeira brasileira prevalecem sobre a cor vermelha, referindo-se ao comunismo. Mas, acrescentou em seu pronunciamento um antigo slogan do Partido Integralista de Plínio Salgado, braço do nazismo no país na década de 1940: “Deus, Pátria e Família”. Exatamente o que repetia Plínio Salgado, maior expressão da corrente ideológica e dirigente supremo do Partido Integralista do Brasil.
Plínio Salgado apoiou o golpe de Vargas quando da implantação da ditadura que começou em novembro de 1937 e se estendeu até 29 de outubro de 1945. Em 1937, Plínio Salgado reivindicava ser ministro da Educação e, para demonstrar a sua força política, promoveu um desfile em frente ao Palácio Guanabara, na Rua Pinheiro Machado, assistido da sacada por Getúlio Vargas. Dias depois, Vargas ordenava a prisão de integralistas. Inconformados, os integralistas em maio de 1938, atacaram o Palácio Guanabara para matar Vargas e sua família. Não conseguiram êxito, mas deixaram a sua marca na história. Marca que foi objeto de um livro importante de Hélio Silva: “1938, Terrorismo em Campo Verde”.
ANALOGIAS – As semelhanças entre o integralismo e o nazismo eram muitas: defesa da ditadura, governo integral, daí o nome do movimento; em vez de camisas negras, camisas verdes; nas mangas, em vez da suástica, o sigma na mesma colocação. Além disso, a saudação nazista era substituída pela expressão “anauê”, saudação indígena. Este é o retrato sintético do integralismo no Brasil.
Um representante do integralismo, o jornalista Gerardo Melo Mourão, foi condenado à morte, como relembra o jovem historiador Daniel Mata Roque num filme que produziu e no livro “A cobra vai filmar”. Aproveitou para este título a frase que marcou a Força Expedicionária Brasileira nos campos da Itália, “A cobra vai fumar”. Isso porque foi atribuída a Vargas uma expressão não confirmada integralmente de que era mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil ingressar na Segunda Guerra Mundial.
A HISTÓRIA E SUAS TRADUÇÕES – Daniel Mata Roque, neto de um amigo meu, Olímpio da Mata, é autor de trabalhos primorosos e importantes sobre a participação brasileira na Segunda Guerra Mundial. Num ensaio recente, ele que integra a Associação dos Ex-Combatentes porque se tornou um historiador importante da passagem do Brasil contra o nazifascismo, lembrou que o Decreto Lei 1561 de 2 de setembro de 1939 adotou uma posição de neutralidade no caso da invasao da Polônia pela Alemanha nazista no dia primiro de setembro. A diferença, portanto, de um fato para o outro, foi de 24 horas. O Decreto Lei estabelecia neutralidade no caso de guerra entre potências não-americanas. A ressalva, como se vê, era de uma importância fundamental.
O governo Vargas havia se estabelecido em 1930, enquanto em 1932 Hitler perdia a eleição para presidente da Alemanha para Paul von Hindenburg, obtendo pouco menos de um terço dos votos, como revelou William L. Shirer em “Ascensão e queda do Terceiro Hasch”. Em 1933, Hindenburg resolve formar o governo convidando Hitler para Primeiro Ministro, pois ambos eram alvejados pelos comunistas alemães. Também em 1933, Hindenburg fica gravemente doente e Hitler assume o poder na Alemanha. Em 1936, o ministro Joseph Gleber pediu a extradição de Olga Benário, grávida de Luís Carlos Prestes. Sua filha, Ana Leocádia, está entre nós e felizmente sobreviveu ao cerco do fanatismo extremista.
ADEPTOS – A Alemanha tinha adeptos no governo brasileiro. De acordo com o trabalho de Daniel Mata Roque , por exemplo, o general Eurico Dutra, ministro da Guerra e presidente da República eleito em 1945, o general Góis Monteiro, chefe do Estado Maior do Exército, o ministro da Justiça Francisco Campos e, na Chefia da Polícia, Filinto Muller. Mas, mesmo antes do alinhamento brasileiro ao lado de Roosevelt, o governo alemão iniciou as pressões contra o Brasil e começou a torpedear navios brasileiros em águas internacionais e também na costa brasileira. Dos 35 torpedeamentos, 33 foram afundados. O primeiro afundado foi em 1941, Taubaté, navio mercante, nas águas do Oriente Médio. O último afundamento foi em 1944, o navio Vidal de Oliveira.
Os ataques alemães provocaram repúdio no Brasil, como é natural. Em 1942, presidida por Hélio de Almeida, estudante de Engenharia, a UNE organizou uma passeata no Centro do Rio conclamando o governo a declarar guerra à Alemanha e à Itália. Helio de Almeida, mais tarde do Clube de Engenharia e ministro dos Transportes do governo João Goulart, foi pedir autorização a Filinto Muller. O chefe de Polícia, negou. Hélio de Almeida e a direção da UNE não se conformam e procuram o ministro da Justiça. Mas, Vargas já havia demitido Francisco Campos.
Helio de Almeida foi recebido pelo ministro interino, Vasco Leitão da Cunha, mais tarde embaixador do Brasil nos Estados Unidos, governo Castello Branco, em 1964. Vasco Leitão da Cunha tinha 29 anos e decidiu autorizar a passeata. Filinto Muller imediatamente saiu da chefatura da Polícia e foi ao Palácio do Catete entregar a sua carta de demissão a Getúlio Vargas que a aceitou imediatamente e a passeata foi às ruas.
ACORDO – Os Estados Unidos e o Brasil negociaram um acordo político e econômico através do qual foi garantido o financiamento para a Usina Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, marco do processo industrial brasileiro. Em troca, o governo Vargas cedia as bases aéreas de Natal e Recife, consideradas estratégicas para o combate aéreo e marítimo aos navios e submarinos e alemãs que cruzassem a costa. Oswaldo Aranha era embaixador em Washington.
Roosevelt veio a Natal em 1943, mas Vargas não convidou Aranha porque temia o crescimento político do embaixador, uma das grandes figuras da história do nosso país, como possível candidato à Presidência da República. Vargas já pretendia convocar eleições em 1945, mas desejava ser ele o próprio candidato. Foi afastado em 29 de outubro de 1945 por um movimento militar. Assumiu a Presidência o presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, hoje nome de uma rua no Leblon.
São faces da história que vêm à tona, da mesma forma que frases como a que foi proferida por Jair Bolsonaro no evento que assisti pela GloboNews, programa de Maria Beltrão. Os fatos não se repetem, daí a divisão do tempo em milênios, séculos, centenários e décadas, mas eternamente sempre, de uma forma ou de outra, aparecerão elos entre o passado e o presente.
DEFESA DAS EMENDAS – O senador Rodrigo Pacheco explodiu na segunda-feira a sua própria candidatura para a disputa de 2022 ao defender as emendas e até mesmo o orçamento secreto do Congresso. A reportagem é de Washington Luís, Folha de SP de ontem. A posição de Rodrigo Pacheco e da maioria dos integrantes da Comissão de Constituição e Justiça contraria a essência da decisão por nove votos a um do STF sobre a matéria.
Rodrigo Pacheco sustentou que as emendas do relator, que fazem parte do orçamento secreto, não são ilícitas e vão salvar muita gente no Brasil. Defendeu a distribuição de verbas através dos parlamentares para a realização de obras públicas em redutos eleitorais esquecidos pelos governos. Pacheco, na minha opinião, esqueceu que a execução de obras públicas pertencem e são uma obrigação do Poder Executivo. Esqueceu também de apagar o pavio de uma atitude que marcará para sempre sua atuação política.
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