Carlos Chagas
Não se encontrará vivo, no Brasil, um só cidadão que tenha comparecido ao banquete de lançamento da plataforma eleitoral de Julio Prestes, o último presidente eleito na República Velha, em 1930 – aliás, garfado antes de tomar posse. Vinha sendo assim em todas as sucessões. Os caciques se reuniam, estabeleciam suas condições e selecionavam seu candidato, paulista ou mineiro como regra.
Às vésperas da eleição,com todos os compromissos firmados, o privilegiado tomava o trem noturno para o Rio e, na sede do Automóvel Clube, na rua do Passeio, lia sua plataforma, ou seja, seu programa de governo. Mais de 200 líderes de todos os estados, fazendeiros e banqueiros podem ser vistos em raros filmes da época, todos de casaca, a maioria se abanando com guardanapos e mais que pudessem. O ar refrigerado não havia sido inventado e o calor na então capital da República era infernal.
As coisas já tinham começado a mudar, porque anos antes Rui Barbosa participara de alguns comícios em praça pública, o mesmo fazendo Getúlio Vargas, ambos derrotados pelas oligarquias. O mundo mudou, campanhas eleitorais viraram sinônimo de diálogo direto com o eleitorado, mesmo pela televisão e as redes sociais.
Pois não é que entre nós tudo ameaça andar para trás? Hoje à noite a presidente Dilma dará o ponta-pé inicial de sua campanha à reeleição. Em praça pública? Diante da multidão reunida ou pelo menos fixada nas telas de televisão?
Nada disso. A campanha começa numa churrascaria. Num restaurante da Baixada Fluminense, com a presença de correligionários variados, chefiados pelo governador Pezão. Anuncia-se que a presidente anunciará sua plataforma, quer dizer, seus planos para o segundo mandato, sem deixar de elogiar o primeiro, mais ou menos como os futuros presidentes, na Republica Velha, elogiavam os que em pouco tempo terminariam seus mandatos.
Estaria o país regredindo? Voltamos aos tempos onde o povo não tinha vez, nem voz, limitando-se a ficar na calçada assistindo a entrada dos potentados no salão do banquete? Mesmo na churrascaria e certamente sem casaca, de bermudas e sandálias havaianas, o eleitor verá a candidata de longe, cercada de costelas e picanhas, discursando para um privilegiado grupo de líderes que gravitam em torno do governo federal e querem seu apoio.
Um lamentável início de campanha, mas não se critique apenas Dilma Rousseff. Onde, até agora, Aécio Neves empolgou as massas ou Eduardo Campos sacudiu as multidões?
Sem saudosismos, é preciso verificar não serem os grandes comícios que impulsionam as eleições, mas precisamente o contrário: são as grandes eleições que impulsionam os comícios. O resultado surge claro: as eleições de outubro estão muito mais próximas do Automóvel Clube do que das praças públicas. Uma churrascaria resolve o problema…
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