Ficando no desalentador
campo político, e já que faltam seis semanas para escolher o novo
presidente etc. e tantos, o fato a se comentar agora é a substituição de
Eduardo Campos por Marina Silva. Uma reviravolta também de
expectativas.
No Brasil, o vice
costuma ser uma caixa de surpresas. Marina confirma a tradição. A figura
dela emerge da cratera de Santos, num quintal da rua Alexandre
Herculano, 197, ainda, paradoxalmente, com a caixa-preta vazia de
conversas.
Pois é, tanto azar faz
desconfiar. Mas foi ele mesmo que tirou do muro os eleitores indecisos,
os brancos e nulos, pousando no recinto de Marina Silva.
Pulo fantástico de 8% para 21% da candidatura do PSB com Marina na cabeça, e não a reboque.
Incrível pensar que Marina ficou fora da cabine de última hora, e assim a história do Brasil mudou totalmente.
PRIMEIRO TURNO
Marina, se estivesse a bordo, concederia à presidente Dilma um caminho livre para liquidar a fatura no primeiro turno.
Consta no seu currículo
ser mais petista que Dilma, que mudou de filiação, saindo do PDT de
Brizola. Marina nasceu e sempre foi do PT. Ela tem característica de
melancia, verde por fora e petista por dentro. Saiu do PT porque não era
levada a sério, como senadora do pequeno e distante Estado do Acre,
“viúva” do histórico Chico Mendes.
Marina agrada hoje à
“classe média emergente”, aquela que se desvencilhou da dependência de
esmolas e, mais ainda, quer se libertar da política maniqueísta,
encenada por petistas e tucanos. Um eleitorado “emergente”, que não se
identifica nem com o proletariado, nem com a burguesia, e quer ficar
fora da moldura dos últimos séculos.
Os globalizados
emergentes aspiram a uma qualidade de vida mais alta, de melhor teor no
mundo de consumo. É um contingente que migra de patamar e ainda não
definiu seu lugar. Esse é o perfil do principal eleitor de Marina.
DESEJO DE MUDANÇA
Ela capta melhor que Aécio o desejo de mudança, apesar de ser mais um retorno ao passado “analógico” do PT inicial.
Ao fechar os olhos, se
enxergam origens silvestres e bucólicas da nossa Amazônia em via de
franca devastação; com mais um pouco de imaginação, se entra no cenário
de “Avatar”, o maior sucesso de ficção e bilheteria da história de
Hollywood.
Marina, mais que outra
sensação, desperta o sonho, como tal entusiasma. Mas imaginá-la na mesa
de presidente dá um calafrio. O sonho parece induzido pelas folhas
amazônicas. Ela tem o efeito de um Santo Daime na política nacional.
Quando a alucinação
desaparece, se enxerga numa severa estreiteza de conhecimento e de
propostas. No manejo de problemas econômicos, uma vez quando se quebra a
couraça de Joana d’Arc, emerge uma figura anêmica, carente de
experiências. Mas ela acredita piamente que, se Lula se deu bem, ela,
além do desconhecimento administrativo, conta com uma boa dose de ética e
honestidade.
LULA ESTARÁ LÁ
Lula é o santo “devocionado” de Marina. Ela, subindo a rampa, garante que a influência de Lula permanecerá no Planalto.
Aécio levou do acidente
de Campos uma tremenda desvantagem, já que, se passar ao segundo turno,
encontrará Marina de braço dado com Lula. Ao contrário, Eduardo Campos
estaria em qualquer lugar menos naquele em que estivesse Lula. Pior
impossível.
Dilma manteve seus
fidelizados “bolsistas”, 36% do eleitorado, refratários a intempéries,
terremotos e escândalos. Um eleitorado vacinado contra tudo. Domesticado
a entender o recado do estômago, como disse Lula em outras campanhas,
condenando cestas de FHC, “o estômago influencia mais que um discurso”.
Marina corre sozinha na raia da terceira via, que Eduardo Campos abriu levando de carona a “indeferida Rede Sustentabilidade”.
Resta ver quando,
exposta aos debates, estimulada a mostrar propostas e programas, Marina
se mostrará; aparentemente se perfila como a menos preparada para
desafios econômicos e sem metas traçadas à sua frente.
O desaparecimento de
Eduardo Campos sinaliza a inevitabilidade de mais PT pela frente. Pois,
se Dilma ganha, nada muda, e, se Marina ganha, o PT será o partido que
lhe dará base e sustentação. Aécio está encurralado e foi o mais
prejudicado. Contava passar ao segundo turno e ter o apoio de Eduardo
Campos. O apoio será, a menos de um milagre, de Marina para Dilma.
DESALENTO
Durante a semana em BH
se notou desalento entre tucanos. Ventilou-se a possibilidade de Aécio
nas próximas semanas renunciar, se o quadro não lhe der possibilidade
para a Presidência. Poderia, assim, fechar um apoio a Marina para ganhar
no primeiro turno e tentar dividir desse modo o bolo entre PSB e PSDB.
Pesquisas já estão nas ruas para testar esse cenário inusitado.
Nesse caso Aécio poderia
voltar a Minas para disputar o governo, estancando a possibilidade de
uma primeira vitória petista para o governo do Estado.
A não ser que outro
avião caia tão atipicamente como o Citation 560 XLS de Campos – modelo
mais seguro do mercado, o único, em 602 unidades em operação, a não
gerar vítimas em 20 anos, apesar das milhares de operações que se
realizam a cada dia –, o destino dessa eleição tomou vulto e contornos
definidos.
Mais uma reflexão sobre a
sorte de Pedro Álvares Cabral. Com uma pequena e frágil caravela,
chegou aqui; Eduardo Campos, com uma aeronave perfeita e robusta, não
sobreviveu a uma manobra. Esse é o Brasil.
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