O surgimento de um estranho vídeo na
internet, no qual um detento de Pedrinhas acusa o candidato a governador
Flávio Dino (PCdoB), de comandar uma quadrilha especializada em assalto
a bancos e tráfico de drogas, serviu para trazer de volta ao debate
político a maior farsa eleitoral da história recente do Maranhão: o
famigerado ‘Caso Reis Pacheco’.
A farsa é a seguinte: às vésperas do
segundo turno da eleição para governador do Maranhão, em novembro de
1994, um tal de Anacleto Reis Pacheco apareceu na televisão, no horário
eleitoral, acusando o então candidato a governador, Epitácio Cafeteira,
de ser mandante do assassinato de um ex-funcionário da Vale do Rio Doce,
José Raimundo dos Reis Pacheco.
A denúncia, ecoada nos programas
eleitorais, teve efeito avassalador. A então candidata do PFL, Roseana
Sarney, que estava 12 pontos atrás de Cafeteira, disparou nas pesquisas e
ganhou a eleição com vantagem de 1% dos votos. “Essa calúnia foi
decisiva para eu perder aquela eleição”, relembra Cafeteira em
reportagem publicada pela revista Veja em novembro de 2001.
A farsa foi desmascarada em seguida,
quando o “assassinado” José Raimundo dos Reis Pacheco apareceu em
público gozando de plena saúde. Ele estava morando em Monte Dourado, no
Pará, onde trabalhava no Projeto Jari. As investigações revelaram que o
advogado Miguel Cavalcanti Neto participara da farsa. Ele recebeu o
denunciante, o tal Anacleto, e encaminhou a denúncia à Justiça,
produzindo a peça jurídica que Roseana exploraria nos dias finais de
campanha.
O advogado, no entanto, sempre negou que
soubesse que o assassinato era uma fraude. No depoimento de abril de
1998, pela primeira vez, o advogado deu um dado adicional. Disse que
abriu as portas de seu escritório para o falso denunciante a pedido de
José Sarney. “Ele me ligou e me pediu que recebesse esse tal Anacleto.
Foi o que eu fiz”, diz.
Irritadíssimo, Sarney admitiu à Veja, em novembro de 2001, que conhecia o advogado, mas negou que lhe tenha feito o pedido. “Nunca recomendei ninguém a ele, não tive nenhuma influência nisso”, dissera Sarney à Veja. O ex-presidente acrescentara que o advogado era um “estelionatário condenado” e que podia estar querendo chantageá-lo com a acusação.
Irritadíssimo, Sarney admitiu à Veja, em novembro de 2001, que conhecia o advogado, mas negou que lhe tenha feito o pedido. “Nunca recomendei ninguém a ele, não tive nenhuma influência nisso”, dissera Sarney à Veja. O ex-presidente acrescentara que o advogado era um “estelionatário condenado” e que podia estar querendo chantageá-lo com a acusação.
Miguel Cavalcanti Neto, de fato, teve
problemas com a polícia. Em junho de 1994, chegou a ser preso e, mais
tarde, acabou sentenciado à prisão domiciliar sob acusação de ter
desviado dinheiro de contas particulares numa agência do Banco do Brasil
em Fortaleza.
‘Vale-tudo’ no segundo turno – Mesmo com o
jogo pesado, que teve também o chamado escândalo da ‘Operação
Granville’, Roseana Sarney não conseguiu vencer a eleição de 1994, no
primeiro turno, realizada no dia 3 de outubro. Ela obtivera 541.005
votos (47,18%) contra 353.032 votos (30,79%) de Epitácio Cafeteira (PPR)
e 231.528 votos (20,19%) de Jackson Lago (PDT). O então candidato do
PSTU, Francisco das Chagas, ficou em quarto lugar com 21.061 votos
(1,84%).
Para vencer no segundo turno, os
adversários do hoje senador Cafeteira começaram a articular uma
estratégia com o objetivo de massacrá-lo perante a opinião pública.
Criaram um roteiro com o propósito de lhe atribuir um crime de homicídio
e de ocultação de cadáver. Para isso não relutaram em cometer uma série
de crimes, começando pela falsificação de documento público para criar
um personagem fictício, um falso irmão do suposto morto, chamado
Anacleto Reis Pacheco. Este falso irmão denunciou no Supremo Tribunal
Federal (STF) que o senador Cafeteira teria mandado matar seu irmão, no
crime definido como denunciação caluniosa.
Em sua coluna semanal, publicada na
edição de seu jornal, no dia 6 de 6 de novembro, o senador Sarney tratou
de disseminar a patranha. No artigo “Liberdade e Reis Pacheco”, começou
a “plantar” a história de que o senador Cafeteira teria mandado matar o
cidadão Raimundo Reis Pacheco, então funcionário da CVRD, que, num
acidente de trânsito, teria matado seu sogro, o conselheiro Hilton
Rodrigues.
Já na segunda-feira, 7 de novembro, a
história ganhava o mundo, entrevistas em TV na região tocantina,
panfletos etc. Aos oposicionistas restava – nos dias que faltavam para a
eleição –, desmontar a farsa. Os deputados Aderson Lago e Juarez
Medeiros (este, candidato a vice-governador) conseguiram localizar a mãe
do suposto morto, que questionada, informou jamais ter parido um filho
com o nome do denunciante ao STF.
Em seguida, localizaram o “morto” no
Amapá, que gravou um depoimento dizendo que a história do crime jamais
existira, que ele estava vivo e em boa saúde. O programa eleitoral que
deveria desmascarar a farsa não chegou a ser exibido em 40% (quarenta
por cento) do Estado.
O advogado Abdon Marinho, que na época
acompanhou o caso, lembra que a construção da farsa foi feita com
precisão cronometrada. Dia 6, o senador divulgou a mentira; dia 7 a
noticia foi difundida por todo o estado; dia 8 o falso irmão do falso
morto bate às portas do Judiciário. No Maranhão, naqueles idos, não
havia internet, celulares e todos os demais meios eletrônicos e
midiáticos que existem hoje. A comunicação era feita só por telefone
fixo, onde havia, rádio e TV.
O resultado da eleição, dentre outros
motivos, foi alterado por essa farsa, marcada pela ousadia dos autores
em falsificar documento público, constituir um advogado e levar uma
falsa denúncia à instância máxima da Justiça, contra um senador da
República.
Nos anais da Assembleia Legislativa do
Estado, consta o discurso do então deputado Juarez Medeiros em que ele
narra todo o episódio ocorrido; foi seu penúltimo discurso proferido
como parlamentar. Nele uma clara exposição de todo o crime que se comete
para conquistar o poder.
O título escolhido para o discurso foi:
“Sarney é marginal”. No dia que foi proferido, o plenário da Assembleia
Legislativa, maioritariamente governista, calou-se para escutá-lo no
grande expediente, durante todo o tempo, nenhum aparte, nenhuma
contestação ao que era dito.
O episódio conhecido como “Reis Pacheco”
fez a história do Maranhão ser modificada pela baixaria perpetrada
naquela eleição. A farsa e outros fatos tiraram a vitória de Cafeteira. A
liberdade – slogan da campanha oposicionista –, perdeu para a fraude e a
farsa.
A Justiça Eleitoral proclamou o resultado
do segundo turno daquela eleição, realizada em 15 de novembro de 1994:
Roseana Sarney (PFL) eleita com 753.901 votos (50,61%) contra os 735.841
votos (49,39%) dados a Epitácio Cafeteira (PPR).
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