quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Os cães de Alfenas e as crianças abandonadas

Mauro Santayana
(Hoje em Dia)
A Câmara Municipal de Alfenas, em Minas Gerais, aprovou lei que prevê o desconto de impostos municipais, como o IPTU, para pessoas que se dispuserem a adotar cães. E por que não fazer o mesmo – de preferência – com quem adotar uma criança ou idoso em situação de abandono? Muitos dirão que a culpa da miséria, no Brasil, é dos pobres, que fazem filhos demais. Se esquecendo, ou fingindo ignorar,  que  a nossa curva demográfica, já é, há anos, descendente,  e que a população brasileira tende a diminuir e envelhecer aceleradamente.
Um quadro que tornará difícil, se nada for feito,  substituir nossa força de trabalho nos próximos anos, deixando o país sem recursos para fazer frente, no futuro, ao aumento das despesas da Previdência Social e do número de aposentados.
O que dá origem ao crescimento do número de bebês e crianças em situação de abandono, hoje, é a falta de informação, a gravidez precoce e as drogas e a violência, com grande número de pais jovens  presos ou assassinados.
PATRIMÔNIO HUMANO
Cada criança que se encontra em um abrigo ou orfanato e que ali cresce sem uma família, é parte do patrimônio humano brasileiro. Mas a maioria sai dessas instituições, ao completar 18 anos, sem preparo, orientação ou trabalho, e vai engordar a fila dos moradores de rua ou da marginalidade.
Orientadas, treinadas, educadas, elas poderiam dar inestimável contribuição à nossa sociedade, caso houvesse estímulo  não para a adoção de cachorros, mas de pequenos brasileiros.
O que precisamos não é incentivar a adoção de cães, mas taxar rigorosamente a sua propriedade, e monitorá-los por meio de “chips”, punindo com pesadas multas quem os abandone. Se considerarmos o número de crianças que não são adotadas por causa da sua idade ou da cor de sua pele, a lei de Alfenas soa como um escárnio. Ou um insulto.
Um escárnio a todos os seres humanos, e  especialmente às crianças que se encontram ameaçadas pela fome, sede e doenças – como o ebola – em vários países do mundo.
Um insulto ao bom-senso, à lógica, à inteligência, quando se lembra que – com menos do que se gasta apenas de ração com um cachorro – é possível, por meio de instituições confiáveis, como os Médicos Sem Fronteiras, assegurar água potável e comida, por 30 dias, para uma criança, como os milhares de órfãos refugiados de guerras estéreis e injustas como as da Síria e da Líbia.
BICHO HOMEM
Com todos os eventuais defeitos que possamos ter, como indivíduos, os cães que nos desculpem, mas a prioridade maior de qualquer homem, mulher ou criança, deveria ser  com sua própria espécie – com a prática da solidariedade – na promoção da dignidade humana.
Se isso nos fosse ensinado nas escolas, e incentivado em nossa atitude e comportamento – inclusive com a isenção de impostos e outros benefícios – haveria menos estupidez, violência e egoísmo. E o mundo seria, certamente, outro.
 
 

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