Eliane Oliveira e Jussara Soares
O Globo
O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, decidiu pedir demissão do cargo. A informação foi repassada pelo próprio chanceler a seus subordinados. Segundo fontes do Planalto, o chanceler e o presidente terão mais uma reunião às 17h. Ernesto disse a Bolsonaro que não quer ser um problema ao governo. A expectativa de integrantes do governo é que a saída do Araújo seja oficializada ainda nesta segunda-feira.
Com a saída de Araújo, o Palácio do Planalto gostaria de nomear outro diplomata para o cargo. Os nomes mais cotados são o de Nestor Forster, que representa o Brasil nos Estados Unidos, e Luis Fernando Serra, que está na França.
MESMA IDEOLOGIA – Considerado o mais cotado para o cargo, o embaixador do Brasil na França enfrenta resistência no Congresso e até mesmo no Itamaraty por ter a postura considerada semelhante à de Ernesto Araújo. A avaliação é que a troca não significaria a mudança necessária na política externa.
Serra é próximo do ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, e o desempenho dele à frente da embaixada em Paris agradou a Bolsonaro. Em setembro de 2019, o embaixador cancelou a participação em um evento com acadêmicos na capital francesa que faria uma homenagem a vereadora carioca Marielle Franco, assassinada em 2018.
Em maio do ano passado, o embaixador saiu em defesa de Bolsonaro e acusou o jornal francês Le Monde de distorcer fatos, após o diário publicar um editorial criticar o presidente por negar a gravidade da pandemia e politizar a crise sanitária. “Há algo de podre no brasil”.
FORSTER NA MIRA – O embaixador do Brasil em Washington (EUA), Nestor Forster, também é uma opção que que terá dificuldades de ser aceito pelo parlamento. O diplomata é alinhado a Araújo e próximo do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Forster também é próximo ao guru da direita Olavo de Carvalho, mas é considerado mais competente e hábil que o atual chanceler.
Auxiliares também sugeriram a Bolsonaro considerar o embaixador Carlos Alberto Franco França, atual assessor-chefe da Presidência. Antes de assumir esta função no final de ano passado, ele era o chefe do cerimonial do Palácio do Planalto e se tornou um dos auxiliares de confiança do presidente.
Já o secretário especial de Assuntos Estratégicos, o almirante Flávio Rocha, é visto como uma alternativa remota. Embora tenha bom trânsito entre embaixadores, o fato de ser um militar desagrada. Rocha também assumiu neste mês o comando da Secretaria Especial de Comunicação (Secom).
OUTROS NOMES – A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, agrada tanto parlamentares quanto embaixadores, mas ela reafirmou diversas vezes que não tem interesse em mudar de pasta. Entre os políticos circulam os nomes do ex-presidente e senador Fernando Collor (PROS-AL) e do senador Nelsinho Trad (PSD-MS).
Araújo vinha sendo questionado pelo Congresso. Na semana passada, o presidente da Câmara, Artur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, pressionaram o presidente Jair Boldonaro a demitir o chanceler. Lira chegou a dizer que Araújo perdeu a capacidade de dialogar com países. Para o Centrão, o ministro impõe obstáculos à compra de vacinas da China e da Índia.
Neste domingo, Araújo chegou a declarar que a pressão do Congresso era por interesses relacionados à tecnologia 5G e não por causa das vacinas contra a Covid-19. A senadora Kátia Abreu (PP-TO), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, reagiu à declaração do ministro dizendo, em nota, que o Brasil não poderia mais ter mais “a face de um marginal” e voltou a pressionar pela saída do ministro.
POLÍTICA ERRÔNEA – Críticas à política externa e às estratégias adotadas por Araújo incluem a deterioração das relações com a China, principal parceira comercial do Brasil desde 2009. Agora, o país asiático também desponta como fornecedor de insumos para a produção da vacina de Oxford/Astrazeneca, fabricada junto à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e da CoronaVac, desenvolvida pela Sinovac Biotech em parceria com o Instituto Butantan.
O GLOBO ouviu 11 diplomatas da ativa que servem em diferentes países nas Américas, no Oriente Médio e na Ásia sobre o legado de Araújo. Na avaliação deles, será necessária uma reconstrução completa da política externa do Brasil, tanto das relações bilaterais com parceiros importantes, como EUA, China e Argentina, quanto com a União Europeia e organismos multilaterais.
Os diplomatas citaram derrotas recentes do Brasil em eleições para organismos internacionais como sinal de perda de força do país.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Conforme avisamos aqui na Tribuna, Araújo já estava demitido desde sexta-feira, mas tinham esquecido de contar a ele. (C.N.)
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