segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Com mais de 530 células, Brasil já é um dos países onde mais avança o extremismo de direita

 

 

Bandeira do Brasil em preto e branco com símbolos da suástica Foto: Mateus Valadares / Reprodução

Ilustração de Mateus Valadares (O Globo)

Janaína Figueiredo
O Globo

Quando figuras como Bruno Aiub, o Monark, defendem aberta e publicamente o nazismo — no caso específico do youtuber, a criação de um partido nazista no Brasil —, elas falam para um público que vem se expandindo de forma expressiva nos últimos anos. Dados da ONG Anti-Defamation League (ADL) mostram que hoje o Brasil é um dos países onde mais cresce o número de grupos de extrema direita.

Estão concentrados, de acordo com monitoramento do Observatório da Extrema Direita (formado por acadêmicos de mais de dez universidades brasileiras e de outros países) e de pesquisa da professora Adriana Dias, da Universidade de Campinas (Unicamp), nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, principalmente.

DIVERSAS CATEGORIAS – Os últimos dados em mãos dos pesquisadores, passados com exclusividade para O Globo, confirmam que São Paulo é o estado com maior presença de grupos, chegando a um total de 137, dos quais 51 estão na capital. Também foram encontradas células de extrema direita em Piracicaba, Campinas, Ribeirão Preto e São Carlos.

Em todo o país, já são mais de 530 células extremistas que, em relatório feito nos primeiros meses deste ano, Adriana dividiu em categorias, de acordo com suas ideologias, como Hitlerista/Nazista, Negação do Holocausto, Ultranacionalista Branco, Radical Catolicismo, Fascismo, Supremacista, Criatividade Brasil, Masculinismo Supremacia Misógina e Neo-Paganismo racista.

Em 2019, a especialista detectou 334 células. Em três anos, tiveram crescimento de 70%, aproximadamente,

15% DOS BRASILEIROS – No Rio de Janeiro, foram encontrados 36 grupos, 15 deles na capital. Entre os bairros cariocas com maior presença de células de extrema-direita estão Méier, Tijuca e Copacabana. Em Niterói, os pesquisadores identificaram outras duas agrupações. Uma delas se apresenta como Cali, e foi responsável pelo ataque à produtora do grupo de humor Porta dos Fundos, em 2019.

— Desde 2018, o Brasil se transformou no país com maior crescimento de grupos de extrema direita. Este fenômeno tem a ver com a eleição de Jair Bolsonaro que, num nível subterrâneo, está vinculado a estas ideologias. Hoje, estima-se que 15% dos brasileiros são de extrema direita — afirma Michel Gherman, membro do Observatório da Extrema Direita, professor de Sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Instituto Brasil-Israel.

Gherman afirma que a eleição de Bolsonaro criou no Brasil uma “Disneylândia do neonazismo”, pois os que o defendem “passaram a se sentir mais à vontade”.

AGINDO ÀS CLARAS – Segundo o professor, apesar de muitos grupos já existirem antes de 2018, o que se observava era “algo periférico”, sem a legitimidade de agora. A opinião é compartilhada por Karl Schuster, professor das Universidades de Pernambuco e Vigo, na Espanha:

— Estas mais de 530 células ganharam autorização para aparecer. A pergunta fundamental não é se estes grupos são ou não fascistas, e sim por que eles trazem para si aspectos do fascismo histórico. O que eles ganham se aproximando desses discursos?

Schuster é especialista em História Contemporânea e acaba de lançar, junto a Francisco Carlos Teixeira, o livro “Passageiros da tempestade: fascistas e negacionistas no tempo presente”.

NEGAR O HOLOCAUSTO – “Estes grupos seguem o princípio da alteridade, de negar o outro. Muitos negam o Holocausto, outros dizem que o Holocausto foi o único erro do fascismo histórico. Querem ressignificar o sentimento de culpa — diz Schuster.

O fascismo, diz o especialista, atrai nas redes um público cada vez maior. O importante, reflete, é tentar entender por que tantas pessoas se aproximam desse discurso, e por que estes grupos estão crescendo.

O professor, que também monitora o avanço da extrema direita, diz que, além de grupos, há os chamados lobos solitários, como em Pernambuco. Ele observa a necessidade de saber se tais lobos estão em contato com redes dentro e fora do Brasil.

VIERAM PARA FICAR – O professor de História Contemporânea da UFJF, Odilon Caldeira, autor do livro “O fascismo em camisas verdes”, também encontrou grupos de extrema direita no Ceará, a maioria em Fortaleza.

Ele afirma que “a extrema direita veio pra ficar no Brasil” e que ela busca permanentemente referências internacionais, articulações e incorporar agendas da extrema direita global:

— Nossa extrema direita tem várias facetas, vertentes, origens e tradições históricas. Um setor busca se articular em torno de Bolsonaro, mas outros vão além. Incorporam a teoria política russa, ucraniana, americana e do centro da Europa. Mesmo se Bolsonaro não se reeleger, a extrema direita permanecerá — frisa.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – A reportagem esqueceu a Ucrânia e outros países europeus, além dos Estados Unidos, onde a extrema direita e o neonazismo florescem muito mais do que no Brasil. Além disso, embora a reportagem não cite, geralmente esses grupos de extrema direita estão impregnados de racismo, o que é espantoso no Brasil, justamente o país mais miscigenado do mundo e que se torna exemplo de  convivência racial. É revoltante que já existam esses militantes sectários por aqui, mas a democracia é assim mesmo e nela também se formam grupos de pervertidos político-sociais, digamos assim. (C.N.)

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